https://pacheco-torgal.blogspot.com/2019/12/o-preco-da-coragem.html
Na sequência do post acima, é pertinente relembrar as recentes declarações da Procuradora Jubilada Maria José Morgado, sobre o tal grupo de peritos criado pelo Governo para apresentarem propostas sobre o combate à corrupção, que ela desvaloriza como sendo apenas "aspirinas", quando na verdade, diz que a gravidade do problema requer medidas radicais como a "quimioterapia". Foi a mesma Procuradora que ontem no Expresso escreveu que "Os que se calam são os melhores amigos dos corruptos"
Armando-se em púdica virgenzinha (um papel que fica muito mal ao Bastonário da Ordem dos Advogados, atenta a incapacidade daquela instituição em punir em tempo os seus associados que se portam de forma pouco ética ou mesmo criminosa) disse o mesmo ao semanário Sol que "a delação premiada é uma contratualização com quem cometeu um crime", convenientemente esquecendo que quando o poder politico que Governa este país anda a apertar a mão ao Sr. Obiang da Guiné Equatorial, está a fazer negócios com um criminoso https://www.amnesty.org/en/latest/news/2019/08/equatorial-guinea-years-of-repression-and-rule-of-fear/
E é exactamente pela mesma razão que Portugal não cortou relações com a Arábia Saudita, apesar do ditador daquele país ter mandado cortar aos bocados um jornalista. Porque negociar com criminosos é a dura realidade inescapável e foi aliás o que andou a fazer meio mundo quando aceitaram reconhecer e tratar como pessoa de bem o Khadafi ou um conhecido terrorista de nome Yasser Arafat, que até recebeu um Nobel da Paz. E convém recordar também, que a Alemanha que conhecemos e é há muito tempo o motor económico europeu, só o foi porque não houve uma purga geral naquele país, para meter na cadeia todos os Nazis, mas tão somente os mais conhecidos, o que significa que implicitamente se fez uma amnistia para milhares de Alemães que colaboraram activamente com o regime Nazi. Ou talvez o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados se tenha esquecido que em Portugal os muitos crimes das FP25 de Abril, que incluíram dezenas de mortes, também foram objecto de uma execrável amnistia.
Por outro lado, se a justiça não pudesse premiar as colaborações de criminosos, isso seria apenas uma rematada idiotice, porque nessa altura jamais um criminoso revelaria onde enterrou o corpo de alguém que matou, porque não teria nenhum incentivo para o fazer. E isso é penalizar duplamente os familiares da pessoa assassinada, que foi o que sucedeu com o tal caso do "Rei Ghob" que nunca revelou onde enterrou as jovens que fez desaparecer. Os familiares das mesmas jovens, que estão enterradas sabe-se lá onde, podem por isso agradecer aos políticos hipócritas do PSD e do PS, o sofrimento permanente que têm de suportar por conta da justiça não poder negociar com criminosos.
Aliás é particularmente atroz ouvir uma certa gente hipócrita a encher a boca para se queixarem que a delação premiada lhes lembra os pides e bufos do antigo regime (facto que é desde logo paradoxal no contexto da recente legislação comunitária que aponta para um reforço da protecção dos denunciantes https://www.europarl.europa.eu/news/en/press-room/20190410IPR37529/protecting-whistle-blowers-new-eu-wide-rules-approved) mas principalmente porque na verdade muitos deles andaram convenientemente muito caladinhos durante o Salazarismo, a tratar da sua rica vidinha, tendo por isso sido coniventes com o referido regime por omissão e cobardia. E também os seus filhos e filhas, a quem corre nas veias um sangue cobarde e que beneficiaram desse silêncio, deviam também abster-se por vergonha em falar de pides e bufos, pois não têm qualquer moral para isso. Recorrendo por isso à famosa comparação que o jornalista João Tavares estabeleceu em tempos entre o Sócrates e a Cicciolina, também se pode dizer que ouvir falar essa hipócrita gente contra a delação premiada, faz tanto sentido como ouvir a Cicciolina a criticar a poligamia.